quinta-feira, 30 de abril de 2015

Noticia de outrora

DE VEZ EM QUANDO…

CADAFAZ A primeira visita!...

Estávamos em 1960, no mês de Junho - cheirando a manjerico e à sardinha assada, dos arraiais populares e do desfile das marchas na Avenida. Vicissitudes imponderáveis da vida, haviam-me afastado quase uma vintena de anos, da terra aonde nasci, o meu Fajão dos almocreves e dos célebres contos do Juiz, que andava sempre com um pé descalço e o outro não encarei, portanto, o meu regresso à Serra, com justificado alvoroço, embora não fosse ainda o retorno à minha terra natal. Mas, casara há poucos meses, e a minha esposa Arminda, era de uma família humilde e respeitável do Cadafaz. E iria, por certo, respirar a brisa que, do Alto Ceira, vinha da minha aldeia ciosamente guardada pelos imponentes Penedos de Fajão, sentinelas eternamente vigilantes.
Ao subirmos as voltas consecutivas da Lousã os panoramas arrebatadores, a largueza dos horizontes, a atmosfera campesina, o odor do mato e dos pinheiros tudo me fazia recordar a ultima vez (com sete anos apenas) que deixara a Serra e rumará para a capital num comboio fumarento, trepidante e vagaroso.
Quando abandonámos o autocarro, na Selada do Braçal (era uma excursão para o Carvalhal do Sapo, por alturas do S. João), a nossa família, meus sogros, meus cunhados, a minha esposa e eu, juntamente com os dedicados cadafazenses, prematuramente já falecidos José Martins (que grande alma.. ) e o Bladimiro Carneiro, e ainda o Silvério Carneiro, felizmente ainda vivo e com uma actividade regionalista intensa e digna de registo, em prol do Cadafaz; não tenho rebuço em confessar que me custou - a mim, habituado ao piso macio e regular da cidade - a calcorrear as ladeiras ásperas, carregado com pesadas malas, pretexto para amigável gáudio dos familiares e amigos …
Chegámos à Portela, ia derreado, cansado depois de quilómetros de pó em terra batida, com bagagem, suado e com calor. Daí avistei o Cadafaz, alcandorado numa vertente do rio Ceira. As suas casas negras, com os seus telhados de lajes, as suas ruas estreitinhas, a vida na aldeia vozear inconfundível dos seus habitantes, a juventude exuberante, tudo serviu para despertar em mim as reminiscências da terra onde nascera. O acolhimento, que generosamente me foi dado, calou bem no fundo no meu ser, jamais o esquecendo.
Desde então a gente do Cadafaz, nunca me canso de o afirmar, tem demonstrado uma hospitalidade, uma maneira gentil e fidalga de receber, franca, leal e sincera, desde os mais humildes aos mais bafejados pela fortuna, que nos diz logo que as virtudes serranas ainda não abandonaram aquele pequeno burgo, escondido entre serranias.
Foi esse carinho que me conquistou e absorveu, e no desfilar dos anos, deixei de ser um intruso antes fazendo parte integrante da comunidade cadafazense, à qual muito me orgulho de pertencer.
E hoje, já a alguns lustres de distância, nada mais grato ao meu espírito, observar a minha querida e saudosa filha, o meu filho e os meus netos, amarem a terra dos seus progenitores. Mas não só por esses laços indissolúveis que me ligam ao Cadafaz, como tributo à verdade, sem receito de desmentido, afirmo convicto nunca me esquecerei da primeira visita e tentando hoje, a cada momento, como ao longo dos anos e do tempo, em todas as oportunidades e em todas as circunstâncias, retribuir a consideração e a amizade recebidas.

António Batista de Almeida
in Jornal de Arganil de 20 de novembro de 2003



Sem comentários:

Enviar um comentário

Agradeço a sua visita e o seu comentário.
Informo que comentários anónimos não serão publicados.
Paula Santa Cruz